sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Museu do Índio: a decisão judicial que permitiu sua demolição


Sonia Rabello
O Estado do Rio de Janeiro, através de seus hábeis advogados, conseguiu induzir à Presidência do Tribunal Regional Federal a suspender a razoabilíssima liminar do Juízo Federal de 1ª Instância que protegia o prédio histórico de sua  iminente demolição.
Vejam abaixo trechos de como a Desembargadora Presidente justificou a sua decisão de permitir a demolição deste patrimônio nacional, cujo valor histórico já foi reconhecido por dois Conselhos de Patrimônio: o municipal e o estadual.
“In casu, sem adentrar o mérito do suposto valor histórico e cultural do prédio onde teria funcionado o “Antigo Museu do Índio”, a despeito de se tratar de construção centenária, não há notícia de que tenha sido objeto de tombamento, encontrando-se, de fato, abandonado pelo poder público há mais de 34 anos, sendo notório o seu péssimo estado de conservação.
Certamente, a inércia do IPHAN – órgão criado em 1937, responsável pela proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, atualmente vinculado ao Ministério da Cultura -, no sentido de promover a preservação daquele edifício, sugere que o mesmo não atenderia a requisitos de ordem técnica, tidos como necessários para integrar o patrimônio cultural.
(…)
Saliente-se que as notas técnicas apresentadas pelo Requerente (fls. 191/201), no que diz respeito às saídas leste do Estádio de Maracanã, aparentemente, encontram-se de acordo com as recomendações e requisitos técnicos da FIFA (fls. 178/189), justificando, em tese, a necessidade de criação de uma área de circulação, exatamente onde se assenta o prédio objeto de litígio, visando à segurança do público que assistirá aos jogos das duas Copas.
Ademais, em que pese a inquestionável proximidade do término do prazo para a entrega do Maracanã, incluindo sua área externa, a tempo de realização da Copa das Confederações, em junho de 2013 – sendo, inclusive, já sabido que, eventualmente, também será necessária a demolição de outras estruturas adjacentes ao estádio, como o Parque Aquático Júlio Delamare, o Estádio de Atletismo Célio de Barros e até mesmo a Escola Municipal Friedenreich -, é certo que Defensoria Pública da União, até o presente momento, não apresentou um projeto técnico alternativo à solução trazida pela Requerente, que, ao mesmo tempo, atenda às recomendações e requisitos técnicos da FIFA e mantenha incólume a estrutura daquele edifício, fundado em seu alegado valor histórico e cultural.
Sendo assim, considerando inexistir elementos de convicção para afastar, neste momento processual, a presunção de legitimidade dos atos praticados pelo Estado do Rio de Janeiro para a realização das obras externas ao Estádio do Maracanã que visem, precipuamente, à segurança do grande público que prestigiará os eventos, tenho, pois, que a tutela antecipada deferida nos autos da Ação Civil Pública nº 0046188-62.2012.4.02.5101, ao proibir, em sede de cognição sumária, a prática de atos abstratos ou concretos de demolição do edifício conhecido como “Antigo Museu do Índio”, acarreta risco de grave lesão à segurança e à economia públicas, tendo em vista a necessidade de honrar os compromissos assumidos pelo Requerente, sob pena de imposição de sanções pecuniárias e descrédito do Brasil junto à comunidade internacional.
Não se diga, porém, que, em face da necessidade de suspensão da eficácia da tutela antecipada, atribui-se ao Requerente, ou mesmo a esta Presidência, a responsabilidade pelo risco de perecimento do objeto da Ação de tombamento compulsório do edifício, pois sempre coube aos antigos proprietários do bem, assim como ao IPHAN, provocar o tombamento do bem, acaso se convencessem de sua importância histórica e artística.
Uma vez suspensa a decisão que deferiu a tutela antecipada nos autos da Ação Civil Pública nº 0046188-62.2012.4.02.5101, prestigiando o entendimento do Juízo da 8ª Vara Federal/SJRJ, no sentido de que a reivindicação pela preservação daquele edifício configura questão prejudicial àquela em que se pleiteia a permanência de índios em áreas adjacentes ao prédio (fl. 110), também deve ser suspensa a eficácia da antecipação de tutela deferida nos autos da Ação Civil Pública nº 0046215-45.2012.4.02.5101, mesmo porque o suposto esbulho do imóvel recentemente adquirido pelo ora Requerente também contribui para o atraso do encerramento das obras para a Copa das Confederações.
Diante do exposto, restando configuradas situações de risco de grave lesão à segurança e à economia públicas a justificar a aplicação do art. 4o, caput, da Lei nº 8.437/1992, CONHEÇO do Pedido e DEFIRO a suspensão dos efeitos das tutelas antecipadas nos autos das Ações Civis Públicas nºs. 0046215-45.2012.4.02.5101 e 0046188-62.2012.4.02.5101.”
Rio de Janeiro, 13 de novembro de 2012.
Desembargadora Federal MARIA HELENA CISNE
Presidente”
Há, ao nosso ver, contradições básicas na decisão, as quais assinalo:
1. O valor histórico e cultural do prédio não pode e não deve ser demonstrado só pelo IPHAN, mas também por órgãos do Patrimônio Cultural de outros níveis federativos, como foi o caso do Estado (INEPAC), e Município (art.23 da CF).
2. Não cabe à Defensoria propor alternativas técnicas à saída e circulação de veículos, mas ao órgão público que está fazendo a obra do Maracanã.
3. O valor do patrimônio cultural do prédio é direito fundamental e não pode ser afastado em função de outro interesse contratual de hierarquia inferior, especialmente em função de obrigações contratuais assinadas com entes privados, como a FIFA.
4.  É certo que a grave ameaça à lesão de interesse público não é a busca de uma alternativa técnica de circulação viária, mas o desaparecimento do prédio histórico simbólico e centenário, da construção da luta pela preservação da cultural indígena no Brasil!
É uma decisão que urge ser reformada !!!
Confira a decisão integral:

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