sexta-feira, 30 de julho de 2010

Pecuária ecologicamente correta - UENF

Pesquisa da UENF estima volume de emissões de gás metano por bovinos criados em pasto; meta é reduzir impacto no efeito estufa (ascom/uenf)

Com um rebanho bovino composto por mais de 200 milhões de cabeças, o Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo e ocupa o quarto lugar entre os produtores mundiais de leite. Mas a atividade é acusada por ecologistas de acelerar o aquecimento global devido às emissões do gás metano durante a digestão dos animais. Para definir com rigor o volume de emissões e propor estratégias para a sua redução, um grupo de pesquisadores da UENF trouxe para o Estado do Rio uma técnica inovadora de medição. A pesquisa é destaque na última edição da revista Rio Pesquisa, editada pela Faperj, que financia os estudos.

Embora o gás também seja liberado para a atmosfera por fontes naturais - como vulcões e pântanos - e por outras atividades humanas, como culturas de arroz, aterros sanitários e lixões a céu aberto, cada vez mais o passivo ambiental gerado pelo metano ganha relevância na discussão sobre a pecuária brasileira e sobre a inserção de seus produtos no mercado internacional. Os adversários da atividade argumentam que o gás metano tem potencial para provocar efeito estufa 21 vezes superior ao gás carbônico (CO2), para um mesmo volume de emissão. Os estudos na UENF têm a coordenação do professor Carlos Augusto de Alencar Fontes, do Laboratório de Zootecnia e Nutrição Animal (LZNA).

A chave para diminuir as emissões está no processo físico-químico ocorrido no interior do rúmen, que é o primeiro compartimento do estômago dos ruminantes. O rúmen funciona como uma câmara de fermentação anaeróbica - sem presença de oxigênio - onde o material ingerido é fermentado. Durante o processo, micro-organismos anaeróbicos decompõem o alimento (rico em carbono, no caso de bovinos criados a pasto, como no Brasil) e geram ácidos graxos voláteis de três tipos: o ácido acético, cuja molécula tem dois átomos de carbono; o ácido propiônico, que tem três; e o ácido butírico, com quatro.

Dos três produtos desta fermentação, o desejável é uma alimentação capaz de gerar mais ácido propiônico, que incorpora átomos de hidrogênio e não produz metano, como explica Carlos Augusto.

- A emissão de metano significa perda de energia contida no alimento, e, por isso, já havia essa preocupação nas pesquisas sobre nutrição animal mesmo antes de se considerar o problema do aquecimento global - explica.

Gases são coletados 24 horas por dia
Para se estimar a emissão de metano com os bois de pasto, usa-se como referência o gás traçador hexafluoreto de enxofre (SF6). Para tanto, uma cápsula que libera quantidades diárias conhecidas do gás traçador é introduzida no rúmen do animal. A mistura de gases expelida pelo animal, contendo metano e o gás traçador, é amostrada durante as 24 horas do dia, durante cinco dias seguidos. Na amostragem, usa-se um equipamento chamado 'canga' (cano de PVC fechado, com pressão interna negativa de 1 atmosfera -ATM) e um capilar (cano fino acoplado ao cabresto) que fica no pescoço do boi. Os gases coletados durante 24 horas são analisados por cromatografia gasosa, capaz de detectar substâncias em nível de parte por trilhão.

Como a taxa de emissão do gás traçador (gás de referência) pela cápsula é previamente conhecida, uma vez determinada a relação existente entre as concentrações do metano e do gás traçador na mistura de gases captada pela canga, pode-se quantificar o volume de metano emitido pelo animal. O projeto tem a participação de pesquisadores do Laboratório de Ciências Físicas da UENF (LCFIS), sob a coordenação do professor Helion Vargas. Mas, enquanto os físicos calibram seus equipamentos de precisão, eliminando a interferência de outros gases ruminais, as amostras têm sido analisadas pela pesquisadora Rosa T. S. Frighetto, da Embrapa Meio Ambiente, com a interveniência de Alexandre Berndt, do Instituto de Zootecnia (IZ-SP), que passaram a integrar a equipe do projeto.


Técnica é pioneira no Estado do Rio

Pioneira no Estado do Rio, a técnica que está sendo implantada na UENF foi adotada pela primeira vez no mundo em 1995. Por meio dela, esperam os pesquisadores, será possível quantificar em bases mais seguras os níveis de emissão do metano. Em sua grande maioria, o boi brasileiro vive em pastagens. O lado negativo disto é que este rebanho gera mais metano do que animais alimentados em cochos, com alimentação concentrada. Mas há um aspecto positivo, pouco considerado, que é a fixação de CO2 pela vegetação do pasto, realizada através da fotossíntese, como ocorre, em grau mais elevado, com as florestas.

- A evidência é de que a quantidade de CO2 fixada em pastagens é bastante grande, comparável inclusive à de florestas. Mas é preciso analisar em profundidade esses dados, o que está sendo feito aqui mesmo na UENF - informa Carlos Augusto, referindo-se a um trabalho em andamento, sob a coordenação do professor Elias Fernandes de Sousa, do Laboratório de Engenharia Agrícola (LEAG).

O boi de pasto também tem a seu favor o fato de atender melhor aos padrões de exigência quanto ao bem-estar animal. Países da União Europeia, por exemplo, têm combatido as condições de confinamento extremadas. Por isso o chamado 'boi verde' também tem apelos ambientais. O problema é que grande parte das pastagens brasileiras é de baixa qualidade. Segundo o pesquisador, pouco mais da metade da área total de pastos no Brasil encontra-se em algum estágio de degradação. Um pasto de má qualidade suporta poucos animais por área, e possibilita pequeno ganho diário de peso, por animal, prolongando o tempo de vida do animal até a condição de abate - o que significa mais tempo de emissão de metano por cabeça.

Por isso uma das linhas de investigação do grupo coordenado por Carlos Augusto é a análise da produção de metano por quilo de carne produzida. No Brasil, a idade média de abate dos bovinos é de 3,5 a quatro anos. A adição de suplementos pode reduzir a idade de abate e modificar a proporção de ácidos produzidos no rúmen, elevando a produção de ácido propiônico e reduzindo a perda energética e os danos ambientais.

Genética pode ajudar
Na vertente genética, a pesquisa busca identificar animais capazes de ganhar peso com maior eficiência energética. Segundo dados da literatura, quanto mais eficiente for o animal na conversão do alimento ingerido em peso corporal, menos metano ele emitirá. Este mecanismo é regulado por centenas de genes, mas existe metodologia adequada para identificar os mais eficientes, quando os animais são submetidos às mesmas condições de meio. A seleção destes para cruzamento gera animais mais eficientes. Programas de melhoramento deste tipo já constituem realidade na Austrália, Inglaterra e Alemanha, e começam a ser implementados no Brasil. Eles trabalham com o parâmetro conhecido como 'CAR', que significa 'Consumo Alimentar Residual'.

Para realizar este tipo de experimento com bois de pasto, é preciso estimar o consumo alimentar diário de cada animal - o que é bem mais complexo do que em condições de cocho. Partindo do ganho de peso médio esperado para cada animal - que se estima matematicamente, em função da quantidade de alimento ingerido -, os pesquisadores selecionam os mais eficientes

Um comentário:

João G. Siqueira disse...

Olá Joca.
Vejo que vc está atento as questões ecológicas. Realmente esse experimento vem desmitificar a pecuária bovina contradizendo aqueles que teimam em criticar a carne vermelha. Ela é a maior fonte de aminoácidos essenciais, de vitaminas e minerais, além da importanmte testosterona para nós homens. Se fôssemos nos suprir de Ca e P nos alimentando de vegetais precisaríamos de quilos por dia, ao passo que com apenas 100 gramas de carne magra temos o que precisamos.
Sobre o metano já está bem explicado na reportagem. Essa pesquisa coloca nossa Campos em consonância com o mundo científico e na vanguarda dos estudos que nos indicarão o melhor caminho a seguir para uma convivência pacífica com a natureza.
Abraços.