domingo, 16 de agosto de 2009

O pagamento pela transposição das águas do Rio Paraíba do Sul

Luiz Eduardo Corrêa Lima



A carência de energia na região metropolitana do Rio de Janeiro e a estimativa futura de que haveria falta de água para o abastecimento urbano, se não fosse encontrado um novo manancial para a então capital federal e o seu entorno, fez com que, em 1953, através de uma grande obra de engenharia coordenada pelos engenheiros da empresa LIGHT de energia elétrica, fosse desenvolvida, no município de Barra do Piraí, a Barragem de Santa Cecília. Nesta Barragem foram instaladas 4 bombas com capacidade de captar uma vazão de 40 metros cúbicos por segundo cada uma delas, totalizando 160 metros cúbicos, ou seja 2/3 da vazão total do Rio Paraíba do Sul no local.



As bombas fazem a água subir, cerca de 50 metros, no sentido contrário, sendo jogadas na vertente oposta da Serra, para depois poder ser distribuída. Só assim, a água captada no Rio Paraíba do Sul pode chegar ao Rio Guandu e servir à Região Metropolitana do Rio de Janeiro.



Em certo sentido, ainda bem que naquela época ainda não existiam as leis ambientais que existem hoje, senão, muito provavelmente, a cidade do Rio de Janeiro e toda a região do Grande Rio não seriam nem sombra do que são atualmente, simplesmente porque não haveria água na região. A obra da transposição produziu um grande impacto ambiental negativo no Rio Paraíba do Sul e em toda a extensão à jusante, muito embora tenha produzido também um grande impacto ambiental positivo para a região do Grande Rio.



Desta forma, desde 1953 que 2/3 das águas do Rio Paraíba do Sul, a partir da represa de Santa Cecília, em Barra do Piraí, deixam de seguir adiante e não chegam até a foz, pois são desviados por ação antrópica para abastecer a região metropolitana do Rio de Janeiro. Em suma, há 50 anos, as águas do Rio Paraíba do Sul abastecem ao Grande Rio (hoje mais de 10 milhões de habitantes) e, lamentavelmente, pouca gente, lá na região metropolitana do Rio de Janeiro, se dá conta desse fato e de sua importância. É fundamental informar à população do Grande Rio que, “o Rio Guandu é, em certo sentido, o Rio Paraíba do Sul” ou que as águas do Rio Guandu que abastecem a Região Metropolitana do Grande Rio são, primariamente, águas do Rio Paraíba do Sul.



O Rio Paraíba do Sul, anteriormente nascia no município de Paraibuna, a partir da confluência entre os rios Paraitinga e Paraibuna, que têm suas origens no alto da Serra do Mar, nos municípios paulistas de Silveiras e Cunha, respectivamente. A confluência natural hoje não existe mais, em conseqüência do imenso reservatório construído no município de Paraibuna, que inundou grande parte da área daquele município (Represa de Paraibuna). Em outras palavras, hoje, a origem do Rio Paraíba do Sul é a própria Represa de Paraibuna, que concentra cerca de 60% de toda a água da região. De qualquer forma, as águas que compõem o Rio Paraíba do Sul, até o local onde ocorre a transposição, são todas originadas no topo da Serra do Mar no Estado de São Paulo. Essas águas atravessam a parte paulista do Vale do Paraíba, passando por mais de 25 municípios e abastecendo diretamente cerca de 2 milhões de pessoas, muitas fazendas e, principalmente, muitas indústrias.



Depois disso, as águas do Rio Paraíba do Sul adentram o Estado do Rio de Janeiro e o atravessam inteiramente, levando suas águas a quase todos os municípios, que estão na baixada e na vertente oeste da Serra do Mar. Na parte final, o Rio Paraíba do Sul recebe ainda águas vindas de Minas Gerais, através do Rio Pomba e assim ele consegue seguir seu caminho, mas tem sido cada vez mais difícil manter uma quantidade razoável de água até a foz, por causa da grande quantidade de retiradas.



As águas do Rio Paraíba do Sul são utilizadas das mais diferentes maneiras possíveis por mais de 80% do Estado do Rio de Janeiro. Pois é, o Estado do Rio de Janeiro é nutrido por águas trazidas pelo Rio Paraíba do Sul, cuja origem é paulista e mineira. Especificamente, cabe lembrar mais uma vez, que as águas que chegam ao Grande Rio são oriundas do Estado de São Paulo e só alcançam seu objetivo graças à transposição.



A Lei Federal 9433/1997, que dispõe sobre a Política Nacional de Recursos Hídricos, trouxe grandes avanços no que tange à gestão das águas. Dentre esses avanços, destaca-se o mecanismo de Cobrança Pelo Uso da Água, cujos objetivos são racionalizar o uso e produzir recursos para reverter em prol da recuperação e da manutenção ambiental da Bacia Hidrográfica para garantir a água no futuro. Essa cobrança foi implementada em toda a Bacia do Rio Paraíba do Sul, em abril de 2003, após o cadastramento dos usuários e muitos estão efetivamente pagando. Entretanto, o principal usuário das águas da Bacia, aquele que retira 2/3 de toda água existente por força da transposição, na barragem de Santa Cecília, isto é, a Região Metropolitana do Grande Rio, ainda não paga pela água que usa.



O Estado de São Paulo, que é o produtor de água do Estado do Rio de Janeiro, precisa continuar produzindo água para que o Rio de Janeiro continue a tê-la. Sendo assim, nada mais justo que o Estado do Rio de Janeiro pague pela retirada para ajudar a manter a quantidade e a qualidade da água de que tanto precisa. Se não existir água em quantidade e se a água não for bem cuidada em São Paulo, não chegará água na Região Metropolitana do Grande Rio.



As populações carioca e fluminense precisam estar conscientes de que, sem o Rio Paraíba do Sul, o Rio Guandu praticamente não existiria e que sem as águas do Rio Paraíba do Sul a população de mais de 10 milhões de pessoas do Grande Rio não poderia ser superior a 2 milhões. O crescimento e o desenvolvimento econômico ocorrido no Estado do Rio de Janeiro, mormente na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, não poderia ter acontecido e não terá continuidade sem as águas do Rio Paraíba do Sul.



Cabe ressaltar ainda, que na Região Metropolitana do Grande Rio, encontram-se 3, das 20 cidades mais populosas do país. Além da capital, a cidade do Rio de Janeiro, há também as cidades de Nova Iguaçu e Duque de Caxias. Sendo assim, é fundamental e preponderante que a Região Metropolitana do Grande Rio, como grande usuário de água que é, passe a pagar pela água que utiliza, ajudando assim a melhorar a qualidade da água que precisa usar.



O CEIVAP (Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul), órgão gestor das águas da Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul, precisa exigir o pagamento pela transposição das águas para a Região Metropolitana do Grande Rio. O prazo de carência que já chegou aos 50 anos não pode mais ser prorrogado, pois o Rio Paraíba do Sul e toda a população da sua Bacia também têm sede e somente um trabalho efetivo de recuperação, cujo custo econômico é muito elevado, poderá manter a quantidade e a qualidade de suas águas. Todos que utilizam as águas do Rio Paraíba do Sul têm que contribuir e o Estado do Rio de Janeiro, que é aquele que mais se utiliza dessas águas, precisa assumir a sua parte nessa conta.

2 comentários:

Unknown disse...

Concordo em genero, número e grau com suas palavras, professor. Aliás sua ligação com o Rio Paraiba do Sul nós que somos seus alunos conhecemos e admiramos

Aline Siqueira, Biologia FATEA,3º ano, 2010.

Um abração!!

Joca Muylaert disse...

Com certeza a Aline se refere ao mestre Luiz Eduardo.
Valeu a passagem por aqui.
Abçs